“Qualquer outra coisa, qualquer
outra coisa que me fizesse parar de afundar nessa existência tediosa, trivial e
covarde”.
Livro maravilhoso de Charles
Bukowsky, Misto Quente é meio que uma autobiografia da infância do autor. Entretanto, no livro, Bukowsky faz uso de seu
alter ego, Henry Chinaski, e conta para nós a história, que se passa por volta
dos anos 1920 até mais ou menos 1940. Durante a leitura, achei muito engraçado
como os EUA nos anos 30 parecia tanto com o Brasil nos anos 80.
O enredo é narrado com crueza e
sem pudor. É a pura realidade de Bukowsky, e é muito legal como o autor não se oprime
e não deixa nenhum fato ou sentimento vergonhoso de lado: tem ele apanhando do
pai; um colega batendo uma para o cachorro; ele desistindo de transar com uma
mulher mesmo ela estando nua, na frente dele; ele dando vários PTs depois das
bebedeiras; apanhando em brigas; enfim, a juventude de Henry Chinaski foi bem
conturbada.
O enredo passa por várias
temáticas como sexo, depressão, adolescência, brigas, família, amigos,
isolamento, aquela sensação de não se encaixar, a pobreza, a desigualdade,
enfim, o que mais tem nesse livro é Henry reclamando do cabaço, dos pais, da
sociedade, da escola e claro, muitas BRIGAS. Gente, a cada dois capítulos tem
porrada. Como esse povo brigava!
O livro tem várias passagens
excelentes, como a do título dessa resenha, é muito filosófico, pessimista e
como já disse antes, real. Peguei alguns trechos para vocês:
1- “O problema era que você tinha
que continuar escolhendo entre o ruim e o pior, e não importa a escolha eles
arrancariam mais um pedacinho de você, até não restar mais nada. Aos 25 anos a
maioria estava acabada. Toda uma maldita nação de bunda-moles dirigindo
automóveis, comendo, tendo bebês, fazendo tudo da pior forma possível, como
votar em candidatos à presidência que os lembrassem de si mesmos.
Eu não tinha interesses. Não
tinha interesse em nada. Não tinha ideia de como iria escapar. Pelo menos, os
outros, tinham algum gosto pela vida. Pareciam entender algo que eu não
entendia. Talvez eu estivesse por fora. Era possível. Eu frequentemente me
sentia inferior. Só queria ir para longe deles. Mas não havia nenhum lugar para
ir. Suicídio? Jesus Cristo, apenas mais trabalho ainda. Sentia vontade de
dormir uns cinco anos seguidos, mas eles não me deixariam.”
2-“Reunidos em volta de mim
estavam os fracos ou invés dos fortes, os feios ao invés dos bonitos, os
perdedores ao invés dos ganhadores. Parecia ser meu destino viajar naquelas
companhias por toda a vida. Isso não me aborrecia tanto quanto o fato de que eu
parecia irresistível para esses companheiros idiotas e estúpidos. Eu era como
um lixo que atraía moscas em vez de uma flor desejada por borboletas e abelhas.”.
3-“Eu podia ver o meu futuro bem na
frente. Era pobre e continuaria sendo pobre. Mas não era particularmente
dinheiro que eu queria. Eu não sabia o que eu queria. Sim, sabia. Queria um
lugar para me esconder, algum lugar onde uma pessoa não tivesse que fazer nada.
O pensamento de me tornar alguma coisa, não apenas me apavorava, mas me deixava
enojado. O pensamento de me tornar advogado, um membro do conselho ou um
engenheiro, qualquer coisa assim, parecia impossível para mim. Casar, ter
filhos, ficar enroscado na estrutura familiar. Ter que ir para algum lugar
todos os dias trabalhar e voltar. Era impossível. Fazer coisas, coisas simples,
tomar parte em piqueniques familiares, Natal, 4 de Julho, o Dia do Trabalho, o
Dia das Mães... será que um homem nasce apenas para suportar essas coisas todas
e depois morre?”.
4- “E minhas próprias coisas eram
tão más e tristes, como o dia em que nasci. A única diferença era que agora eu
podia beber de vez em quando, apesar de nunca ser o suficiente. A bebida era a
única coisa que não deixava o homem ficar se sentindo inútil e atordoado o
tempo todo. Tudo mais te pinicando, te ferindo, despedaçando. E nada era
interessante, nada. As pessoas eram limitadas e cuidadosas, todas iguais. E eu
teria que viver com esses putos pelo resto da minha vida, pensava. Deus, eles
todos tinhas cus, e órgãos sexuais e seus sovacos. Eles cagavam e tagarelavam e
eram tão inertes quanto bosta de cavalo. As garotas pareciam boas à distância,
o sol provocando transparências em seus vestidos, refletido em seus cabelos.
Mas chegue perto e escute o que elas tem na cabeça sendo vomitado pelas suas
bocas. Você ficava com vontade de cavar um buraco sobre um morro e ficar
escondido com uma metralhadora”.
Bom, para finalizar, posso dizer
que amei o livro, ele é curto, bem rápido de ler, a narrativa é super gostosa,
o enredo é bem legal e muito atual, e principalmente para você, jovem
revoltado, leia Misto Quente, e você verá que não está sozinho nessa ;)
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